30/11/2005

O DIÁRIO DE MARIA
2 - Pré Adolescência (Cont.)
A entrada de Maria no Liceu D. Duarte, teve repercursões devastadoras na sua vida.
Sentiu-se completamente desajustada com todo aquele cenário de pós-revolução. O 25 de Abril de 1974, trouxe ao ensino enormes mudanças. Tudo o que antes era proíbido, passou a ser palavra de ordem, nomeadamente, faltas de educação, permissividade e afins. Sentia-se desajustada, entre aquela nova realidade e a educação rígida dada pelos pais.
A irmã Ana, tinha já o seu grupo de amigos, era uma bela moçoila. Nos seus 13 anos era já uma mulher formada. Maria pelo contrário era magricela, enfezada, ficava sempre na sombra de Ana.
Ana a adorada, Maria a ignorada, era assim que se sentia, o patinho feio.
Foi-se isolando cada vez mais.Passava longos momentos sozinha, sem falar com ninguém, mas também ninguém dava por isso.
Por essa altura, apaixonou-se pela primeira vez, por um dos amigos da irmã.
Vítor era lindo, um belo rapaz, que a fazia sonhar com momentos de ternura e amor, sonhava com ele a dormir e acordada. Vivia para aquele amor. Cada momento passado a seu lado era um sonho.
Pobre inocência, algum tempo depois, Vìtor abandonou o liceu. Engravidara uma míuda que trabalhava na fábrica, e teve de se fazer á vida. O sonho de Maria acabara mesmo antes de começar.
Quando tinha 10 anos, sua mãe fizera um ultimato ao pai: "Ou deixas de beber, ou eu deixo-te. levo os meus filhos comigo e vou embora. Já não suporto aturar-te mais as tuas bebedeiras. Escolhe, mas escolhe rápido"
...E o pai escolheu: " Vou fazer o tratamento, mas tens de deixar vir outro filho para o lugar do Francisco"
A mãe concordou,, e o pai lá foi direitinho ao Sobral Cid, única instituição, onde na época se fazia desintoxicação alcoólica.
Dessa altura, a única lembrança que Maria guarda, é de ir a pé kms. com a mãe, para o visitar e lá chegadas o ver numa atitude apática e alucinada, sentado, a cabeça quase em cima dos joelhos, sem dizer uma palavra. Era deprimente, andar tanto a pé para o ver, e nem uma palavra lhe ouvir.
Na volta fizeram o caminho a pé novamente, a mãe não tinha dinheiro para o autocarro, mas tinha muita esperança no futuro.
Foi a única vez que a menina foi ver o pai.
Conforme as semanas foram passando, iam-lhe permitindo ir passar os fins de semana a casa. Quando voltava eram-lhe feitas análises de controle. todas deram negativas para alegria daquela família, que teimava em levar uma vida de gente...
O pai de Maria não voltou a beber. No último fim de semana de ida a casa, sua mãe engravidou. Cumpriu a promessa.
Rui o mais velho tinha já 19 anos e Maria a mais nova 11.
Todos ficaram muito felizes, aquele bébé era o fruto da promessa e da redenção do pai.
Finalmente íam ser uma família de verdade.
A benjamim da família, chamou-se Cláudia, era a alegria de todos. O pai olhava embebecido para ela, mais ainda porque herdara o espírito brincalhão e divertido do falecido irmão.
Ana e Maria, tinham agora uma boneca de carne e osso para brincarem, eram felizes.
Os pais lentamente íam recuperando financeiramente, construíram uma casa, podendo elas abandonar, aquela velha casa que fedia a ratos e com paredes a desfazerem-se.
Abençoaram e agradeceram aquela irmã, fruto da promessa e da esperança.

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